quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Dino Buzzati


A Noite


"O medo vem, sem precisar de nada, com o nascer de certos seres imprevisíveis, reunindo-se primeiramente ao longo das sebes, nos valados já escuros, junto dos velhos muretes desmoronados. E atrás das igrejas solitárias, não? E naquele relvado junto à abside onde nunca passa ninguém? Contudo, ao fim da tarde poder-se-ia reconhecê-lo, aqui e ali, pois aproximava-se: por exemplo, naqueles longos chamamentos que, do outro lado do rio, duas pessoas trocaram a uma distância muito grande, através dos campos; por exemplo, no aluimento amarelado, naqueles pequenos buracos incompreensíveis que eram já abertamente um antegosto da noite; ou na sensação repentina de que também este era um dia perdido (e talvez a própria vida?). Sentado no jardim, ele até vira um cão fugir precipitadamente pelos pastos desertos, lá em cima, no alto: o animal estava sozinho e a certa altura perdera-se na extrema distância, confundindo-se com a verdura imóvel. (Mas ninguém o havia pensado, porque era um dia de sol, claro e cálido, propício aos projectos e aos amores, que fazia esquecer o resto. Era, infelizmente, a última tarde boa, mas não o sabíamos.)
Mas depois viera o grande e justo silêncio dos campos, aquietaram-se as aves, as vespas, todos os insectos, só o rio distante permanecia com a sua voz melancólica. Também os últimos sinos de tinham cansado, os fumos das casas no meio das árvores iam-se confundindo com a sombra, e no coração havia recordações, uma doce tristeza, ilusões."

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